“Perdi-me muitas vezes
pelo mar
Ignorante da água
Vou buscando uma morte
de luz que me consuma”
Frederico García Lorca
C’est arrivé beaucoup de fois. Primeiro,
ele se mostra calmo, seguro e acolhedor. Depois, começa a se afastar. Se afasta
e volta, se afasta e volta, se afasta e volta, cada vez com mais força. Até que
de repente, ele desaparece. E então tudo se torna areia e sem hesitação, sem
pudor ou piedade alguma, ele devasta tudo. E então eu acordo. Eis o sonho que
já tive inúmeras vezes com o mar. Não é sempre o mesmo mar, não é sempre o
mesmo enredo. Da última vez, eu já sabia o que ia acontecer, mas mesmo assim
quis ficar pra ver mais uma vez o fim que eu já conheço de cor. Nesses sonhos
sempre tenho a sensação da morte. Não que eu já tenha morrido pra conhecê-la de
fato, mas sinto o desespero e a sufocante sensação de limitação que imagino que
sentirei no dissabor do derradeiro suspiro.
O mais contraditório é que ao
contrário dos meus devaneios, dentro da minha realidade palpável não há outro
lugar que eu mais queira estar senão junto ao mar. O mistério, a calmaria, a
sensação de pequenez que sinto diante dele me fazem querer sempre estar lá pra vê-lo
acontecendo. A gente nasce, a gente cresce, o tempo passa, a vida acontece e lá
continua ele e suas ondas numa eterna coreografia com as pedras. É tão fácil
perder-se pelo mar. É tão fácil entregar-se ao sutil deleite da magnitude e da
leveza de ser mar. É tão fácil se apaixonar, se deixar seduzir por ele. Mas o
mar, ah o mar.. tudo é mais fácil quando se está diante do mar. As coisas mais
bonitas dessa vida se diferenciam por duas vogais e um espaço “o mar” e “amar”.
Mas eu nunca me esqueço do sonho. On ne sait jamais. A gente nunca sabe. As
duas coisas mais bonitas são para mim as mais traiçoeiras. Eu sei, eu já fiquei
lá inúmeras vezes para ver. O mar e amar dentro de mim são duas coisas depredadoras.
São duas coisas que podem te reduzir a nada, te destruir completamente,
exterminar qualquer possibilidade de voltar a sonhar.
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